Calma, eu explico. A primeira vez que eu fui para o Rio de Janeiro foi em 1996, numa época em que ainda existia o Trem de Prata, e pior, voei Transbrasil! De lá pra cá, passaram dez anos e quatro vindas, todas elas com algum propósito diferente. A primeira, pra conhecer. A segunda, para passar o Carnaval, e de quebra, ver o desfile. A terceira, para rever. E esta, para passar o Reveillon mais famoso do mundo (na verdade, o mais famoso mesmo é o de Sydney, que é a primeira cidade grande, famosa e "carioca" a virar o ano).
Mas como toda viagem, seja curta, seja longa, teremos o nosso extepe-out. Como nas últimas três vezes eu fazia aquele binômio turista Corcovado/Pão-de-Açucar, nesta temporada não fiz, mas fiz coisas muito legais. Veja:
29/12/2005 - A chegada
Chegando no Rio de Janeiro, fui recebida com votos de boas festas de ninguém menos que Eurico Miranda. Depois, fui dar uma andada pela praia de Copacabana, e reparei que havia um grupo enorme de pessoas vestidas de branco com balangandãs azuis e flores para jogar ao mar. Para não atrapalhar o ano-novo, muitos umbandas pegaram aquele dia e jogaram oferendas para iemanjá*.
30/12/2005 - Rio Antigo
Dia de passeio. Peguei o metrô e desci no Largo da Carioca, uma espécie de Praça da Sé carioca, com direito a pombas, menores e pastores. Estava rolando uma feira do livro com ofertas interessantes. E como era último dia de expediente, os prédios da região faziam chuvas de papel picado, papel rasgado e até mesmo papel inteiro, fazendo daquilo um belo espetáculo. Fui na Igreja de São Francisco da Penitência, cuja escadaria é grandinha, mas compensa a visita. Esta igreja é folheada a ouro, assim como as de Salvador e Ouro Preto, e permanece conservada porque é usada.
Daí, passando "cedo, na rua do Ouvidor, quantos brancos horríveis eu vi". Tentei em vão entrar no Real Gabinete Português de Leitura, fechado. Parecia o Largo São Francisco, a praça São Francisco de Paula. Depois, passei pela Avenida Rio Branco, semelhante a nossa e à Avenida Ipiranga. Conheci a praça XV de onde as pessoas pegavam barcos para Niterói (aquele do clipe dos Paralamas, manja?). De lá, fui para a Confeitaria Colombo, uma confeitaria conservadíssima, que era freqüentada por boêmios e políticos das antigas. Inclusive a marchinha "Sassassaricando" foi composta na porta da Colombo. Fechando a manhã, conheci o Bar Luiz, indicado pela Vejinha de lá como o melhor botequim (e não "boteco", que é coisa de paulista), o melhor chope e o melhor salsichão do Rio.
30/12 ainda - Vem pro bonde!
A melhor aventura do dia ficou em andar de bonde, no bonde Santa Tereza. O bonde todo antigão, com um monte de coisas para os surfistas se pendurarem. Deu a largada como se fosse montanha russa. ("Bota pra subir!") Passamos sobre os Arcos da Lapa, e de lá de cima pude ver o Circo Voador, que lançou tanta gente famosa nos anos 80, e hoje faz festinhas "Trash 80s" locais. Entramos no bairro de Santa Tereza, uma espécie de Vila Madalena local, com casinhas bucólicas, albergues bed and breakfast e gente como a gente. Mas o passeio tinha que ter algo inusitado. O fio do suspensório que puxava o bonde caiu e ficou um bom tempo parado. O maquinista, aqui chamado de "Bigode", teve que subir no bonde para arrumar, numa cena onde moradores e turistas tiravam várias fotos do tiozinho reclamando que sujou sua mão. Arrumado o bonde, seguimos viagem até que o Bigode pediu pra parar. Parou em frente a um bar para lavar a mão. Pegou detergente, passou, foi ao banheiro, voltou e enxugou suas mãos no jornal.
O passeio de bonde ainda teve cenas inusitadas como um táxi que vinha vindo em direção contrária e foi um auê para os dois se entenderem. Outro perdeu o chinelo, e teve que parar o bonde para buscá-lo. Sem contar quando o bonde emperrou e não conseguia subir. Subiu e o Bigode foi aplaudido pelos turistas de alma suburbana daquele lugar. Da Cinelândia, peguei um bus pra Lagoa Rodrigo de Freitas para ver a iluminação de Natal e seu balé de águas.
31/12/2005 - Rio 40 graus
De manhã passeei pela Praia de Copacabana, lotadésima. Já viram Caraguá dia 31/12? E Praia Grande? Pois não tem nem comparação, que é muito maior, é mundial. A praia estava lotada de gente de vários locais, do Rio, de Sampa, do Sul, argentinos solteiros, famílias estadunidenses, gays europeus, australianos tomando caipirinha, japoneses tirando fotos, ricos e pobres, suburbanos e playboys, todos na verdadeira democracia. Sem contar que me senti em um pedaço da Praia Grande, vendo a quantidade de vendedores de paraquedinhas de plástico, barraquinhas de bóias, e cenas inusitadas, como inocentes crianças brincando com o que restou de um barquinho de oferendas de iemanjá. Parei na Pedra do Leme, pois estava quase beirando os 40oC na orla e eu queria sombra. Dava pra ver no mar os rebocadores arrumando as balsas. E ela, a Globo, apareceu lá para filmar todo o movimento. Como naquele local haveria a bateria da Unidos da Tijuca, ritmistas e passistas apareceram para ensaiar e aparecer na TV local. Juntou uma roda enorme onde moradores e turistas caíram no samba junto com eles. E saindo de lá, apareceu Emílio Santiago. O cantor de Saigon estava descansando e tirando fotos com fãns Roberts para depois ir cantar no Reveillon.
Na volta da praia, pelo calçadão, o movimento ficava no Bar Luiz montado especialmente para o evento, onde um grupo de sambistas artistas de rua faziam o seu showzinho. Um turista me perguntou:
- De que escola?
Respondi e ele ficou lá babando. Mas não era só ele. Em uma mesa animada, Bete Mendes (isso mesmo, aquela atriz) e seus amigos pediam músicas para eles. E para completar, apareceu quem???? A Globo, filmando toda aquela muvuca e pasmem!!! No meio disso tudo, eu apareci na TV, na segunda edição do RJTV, toda Robert assistindo ao espetáculo, que ficava mais completo com a esquadrilha da fumaça desenhando números e letras no céu, e rapazes vestidos de mulher fazendo tchu-tchu nos seus amigos.
31/12 ainda - Anoiteceu, olho pro céu e vejo como é bom
A Avenida Atlântica já estava interditada, o palco já estava montado, os vendedores já estavam se virando com suas cangas, camisetas 2006 Copacabana, com seus bonés da Gramorosa, e as quiosques preparadas para venderem gorós a fio, competindo com as barraquinhas de pipoca, churros, salsichão no espeto. Chego na praia de Copacabana, onde 2 milhões de pessoas mais quatro transatlânticos estacionados em frente aguardavam 2006 e os fogos. Muitas pessoas ajustavam suas cangas, suas cadeiras, seus pedacinhos de areia. Alguns umbandas que não vieram na quinta fizeram seus rituais no dia mesmo.
No meu pedaço estava rolando o show do Jorge Aragão, uma simpatia com seus dedinhos gordinhos no cavaquinho, seu óculos, sua bandana e seu sorriso. Mas a acústica do local acabou não ajudando. Tanto que em certos momentos, eu escutava Fernanda Abreu cantando: "Eu estou vestida com as roupas e as armas de Jorge". Tá nada, boba! Tanto que Jorge estava lá, vestido, armado e parapetado, mandando durante sua roda de samba um "Trem das onze" em homenagem aos paulistas que estavam lá. E o helicóptero da polícia passava pela praia para averiguar ocorrências, mas muita gente achava que era o Globocop e dava tchauzinho.
Terminado o show, olhos atentos para as balsas e para o mar. Alguns Ayrton-Senna-wannabe pegam suas cidras e começam a jorrar em cima das pessoas, molhando a tudo e a todos. A contagem regressiva foi feita pelos fogos, mas não teve muita graça. Muitos números não foram identificados. Eu só identifiquei o 5. Entra 2006 e a maratona de fogos. Inexplicável. Quem vê pela TV no show da virada não tem idéia de como é lindo ao vivo. Foram 16 minutos ininterruptos de fogos, e mais 3 de repeteco. Alguns tinham formato de estrelas, planetas, arco-íris. Outros, pareciam vir em nossa direção. Via-se também os flashes dos transatlânticos, e pessoas da orla também tirando foto e filmando para a posteridade. As pessoas gritavam: "Ó!" quando viam um mais bonito que o outro. Muito se preocupou para evitar o fumacê do ano passado, mas só vi fumaça mais pra direita, dando para enxergar praticamente todos os fogos. Eu tentei registrar alguns destes momentos, destacando este aqui. Pena que no meio da emoção, um garotinho** roubou a câmera de uma menina que estava perto de mim.
No final dos fogos, a praia toda aplaudiu. E, mesmo depois de tanta beleza, alguns gatos pingados ainda soltavam seus traques Caramuru, que mesmo não dando chabú, só faziam barulho.
Depois, começou a bateria da escola de samba Beija-Flor (no meu pedaço), mas parou logo porque começou a chover.
01/01/2006 - A volta
Veja como os garis do Rio são rápidos. Às 7 da manhã, ainda tinham alguns bêbados e remanescentes da festa, e muitos já vinham pra praia pegar o primeiro sol do ano. Os garis tiravam todo o resto de 2005, incluindo rolhas de cidras, gorós, flores de iemanjá. Às 10, quando passei por lá de novo, estava tudo limpinho, nem parecia que há horas havia mais de 2 milhões de pessoas lá.
Na volta, descobri onde ficava o piscinão de Ramos. Já sei onde irei na próxima vez que irei ao Rio.
* Aí vai minha pergunta: se o povo acredita que ela é rainha do mar, você não acha que ela não devia ficar tiririca de sujarem-no?
** Trocadilho proposital.
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